Parcerias público-privada no Brasil: poderíamos usá-las mais (e melhor)?

Fernando Deodato Domingos, professor de estratégia (fernando.domingos@fgv.br)

Parcerias público-privada (PPPs) mostram-se muitas vezes eficientes por combinar capacidades do governo com outros recursos de empresas. Elas são especialmente usadas em projetos de infraestrutura; multimilionários, inclusive. Projetos que devem ser bem desenhados e monitorados, já que, como tudo na vida, não são perfeitos: PPPs geram novas oportunidades de corrupção, dentre outras questões. Se bem estruturadas, entretanto, podem ser bem-sucedidas em variadas áreas.

Aqui eu argumento que há um caminho a ser explorado no Brasil: PPPs um tanto “menores” e focadas em problemas sociais complexos. Os social impact bonds (ou contratos de impacto) são PPPs que envolvem contratos baseados em resultados, nos quais governos e investidores fazem parcerias com prestadores de serviço em diferentes áreas, visando alcançar resultados para populações vulneráveis. Esse tipo de PPP, inicialmente desenvolvido no Reino Unido, é tão inovador quanto polêmico por atrelar o atingimento das metas ao retorno dos investidores. Tais investidores variam desde o Banco Mundial até  pequenos fundos de impacto, e deveriam receber o seu retorno apenas se comprovado o sucesso do projeto.

Por esse motivo, os contratos de impacto são também chamados de ‘pay-for-success’ nos Estados Unidos e perpassam projetos dos vários setores da sociedade, desde o sistema prisional até a saúde e educação. Existem projetos, por exemplo, que visam diminuir a evasão escolar, ou gerar emprego e dar acesso à moradia para população sem-teto, melhorar a qualidade de hospitais públicos, entre tantos outros objetivos.

Tais contratos também estão presentes na América do Sul, ainda que em menor proporção quando comparado ao hemisfério norte. Argentina e Colômbia são exemplos com alguns casos. Já existiram projetos para implementação no Brasil, mas que não saíram do papel. Qual então o motivo de não termos projetos assim por aqui?

Apesar de eu argumentar que esse é um caminho a ser explorado, é importante dizer: a ser cuidadosamente explorado. Nos casos do Brasil, os contratos foram engavetados devido à desalinhamento entre as partes interessadas e importantes dilemas éticos.  Os motivos não estariam relacionados a nenhuma particularidade brasileira. Um recente livro sobre o tema, de coautoria do renomado autor australiano Mark Considine, chama – não por acaso e de maneira bastante provocativa – “Buying and Selling the Poor” (tradução minha: “Comprando e Vendendo os Pobres’”). Em grande resumo, não é trivial alinhar objetivos financeiros e sociais, tampouco trazer investidores com fins lucrativos para esses problemas sociais tão complexos. Nem na Austrália, nem no Brasil.

Mas… se nada na vida é perfeito, também não significa que tudo tem problema. O debate deve acontecer, para que soluções sejam elaboradas e contratos de impacto deslanchem, se – e somente se –  bem desenhados. Os benefícios existem e governos em situações críticas não devem recusar de maneira impensada o apoio para causas urgentes. Por outro lado, a urgência não deve ser usada por investidores como estratégia para “lucrarem em cima dos necessitados”, como alertam Mark e coautores. Há governos e empresas bem capacitados no Brasil para esse debate.

 

 

 

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