Alexandre Lima, Aluno do Doutorado Profissional em Administração da FGV EAESP, Executivo de Tecnologia da Informação.
No imaginário empresarial atual, poucas palavras causam tanto entusiasmo, e tanta frustação, quanto “inovação”. Quando associada à inteligência artificial (IA), esse entusiasmo cresce ainda mais. Mas há um risco real em tratarmos a IA apenas como um caminho inevitável para o progresso. Ao se deixar levar pela promessa tecnológica, muitas empresas estão esquecendo um princípio essencial: inovação exige estratégia.
A IA vem modificando os contornos do que entendemos por operação eficiente, marketing personalizado, logística inteligente e até atendimento ao cliente. Seu poder é inegável. Mas a forma como ela tem sido implementada muitas vezes revela mais improviso do que visão. E, sem um rumo claro, a tecnologia pode facilmente deixar de ser aliada para se tornar fonte de desperdício, frustração e risco.
A IA não é uma solução mágica para todos os problemas, mas é, acima de tudo, uma ferramenta poderosa nas mãos de empresas que têm clareza sobre onde querem chegar. Para usá-la com propósito, é fundamental definir o tipo de inovação almejada com base na teoria de Clayton Christensen: a incremental, voltada a melhorias contínuas em produtos e processos existentes; ou a disruptiva, que geralmente começa com soluções mais simples, acessíveis e de menor desempenho, direcionadas a públicos negligenciados por grandes empresas. Ainda que inicialmente não atendam às exigências do mercado principal, essas inovações disruptivas ganham força com o tempo, evoluindo até competir com os líderes estabelecidos e transformam radicalmente a lógica de mercado. Em vez de apenas aperfeiçoar o que já existe, criam formas de valor, muitas vezes sustentadas por modelos de negócio totalmente inéditos.
Ao desenvolver uma estratégia de IA, é essencial compreender que a inovação deve ser abordada sob três dimensões integradas: como um resultado, como um processo e como um mindset. Essa visão abrangente é fundamental para garantir que a IA gere valor real e sustentável para as organizações.
Inovação como resultado refere-se aos objetivos concretos a serem alcançados, como a criação de novos produtos, modelos de negócios ou melhorias operacionais. Trata-se do “o quê” da inovação. Em IA, isso pode significar desde a personalização de ofertas até a automação inteligente de tarefas.
Inovação como processo diz respeito ao “como”, ou seja, às metodologias que estruturam e viabilizam a geração desses resultados. Inclui práticas como o desenvolvimento ágil, ciclos iterativos e gestão estruturada da inovação. Sem processos bem definidos, as iniciativas de IA tendem a se perder em esforços descoordenados ou improvisações de curto prazo.
Inovação como mindset envolve o “estado de ser” da empresa. Vai além de ferramentas ou processos, tratando da internalização de uma cultura inovadora por parte dos colaboradores. Isso exige fomentar atitudes como curiosidade, tolerância ao erro e colaboração interdisciplinar. Sem essa base cultural, a adoção de IA corre o risco de ser superficial ou limitada a ganhos de eficiência.
Ignorar qualquer uma dessas três dimensões pode comprometer o impacto da IA, portanto, compreender que inovação é simultaneamente um resultado, um processo e um mindset é um passo fundamental para torná-la verdadeiramente realizável.
Outro ponto importante quando falamos de estratégia de IA, é o desejo de automatizar tarefas. A tentação de automatizar é grande, e há ganhos reais nisso. Mas o que separa as empresas que crescem com IA daquelas que se perdem é a capacidade de usar a tecnologia para repensar como entregam valor. A IA bem aplicada pode ajudar a desenhar novos produtos, a explorar mercados inexplorados ou até a reinventar formas de relacionamento com os clientes. Isso exige decisões difíceis. Afinal, inovar de verdade implica abandonar certos confortos, práticas consagradas, estruturas rígidas e métricas ultrapassadas.
Existe ainda uma dimensão muitas vezes negligenciada: a cultura organizacional. Embora a liderança fale em inovação com entusiasmo, para muitos colaboradores o termo desperta medo. Medo de perder o emprego, de ser avaliado por critérios que desconhece, de não acompanhar o ritmo imposto pela tecnologia.
Por fim, a pergunta mais importante talvez seja: a inovação está servindo ao propósito da empresa? Inovar por inovar, ou por pressão do mercado, pode levar a investimentos incoerentes com os valores e a proposta de valor da empresa. Já uma inovação coerente com a estratégia amplia a vantagem competitiva e fortalece a identidade da marca.
Texto originalmente publicado no blog Gestão e Negócios do Estadão, uma parceria entre a FGV EAESP e o Estadão, reproduzido na íntegra com autorização.
Os artigos publicados na coluna Blog Gestão e Negócios refletem exclusivamente a opinião de seus autores, não representando, necessariamente, a visão da Fundação Getulio Vargas ou do jornal Estadão