A contratação pública representa mais de 12% do PIB mundial e, além de movimentar bilhões, tem o potencial de influenciar práticas sustentáveis em escala. Uma nova pesquisa mostra que renegociar contratos públicos com foco em sustentabilidade não só gera impactos ambientais positivos como também reduz conflitos e custos ao longo da execução dos contratos. Isso contraria a percepção comum de que renegociar contratos seria sinônimo de má gestão ou aumento de gastos.
O estudo analisou mais de 80 mil modificações em contratos públicos de países da União Europeia entre 2016 e 2021. Os dados vieram do sistema oficial da UE, o Tenders Electronic Daily (TED). O foco foi entender o motivo das renegociações, o tom das interações (mais cooperativas ou conflituosas) e o impacto nos valores dos contratos.
A pesquisa é assinada por Fernando Deodato (FGV EAESP), Carolyn Heinrich, Stéphane Saussier e Mehdi Shiva. Os pesquisadores publicaram na International Journal of Commerce and Contracting e recebeu o prêmio de Melhor Artigo do Ano.
Um dos principais achados foi que as renegociações motivadas por objetivos sustentáveis — como inclusão de critérios ambientais ou sociais — estão ligadas a relações mais cooperativas entre as partes. Em outras palavras, quando os contratos são ajustados para incluir preocupações sustentáveis, o processo tende a ser mais amigável e produtivo.
Renegociar contratos não é sinônimo de problema — pode ser solução
Além disso, o estudo não encontrou evidências de que essas renegociações aumentem os custos dos contratos, o que rebate o medo comum de que ações, mesmo que em nome da sustentabilidade, tragam prejuízos ou sejam uma forma de disfarçar má gestão.
O trabalho mostra que renegociar contratos pode ser uma ferramenta legítima para adaptar acordos às exigências atuais de sustentabilidade, especialmente quando há abertura para o diálogo entre governos e empresas. A análise de sentimento aplicada nos dados identificou que renegociações sustentáveis têm maior chance de serem positivas, com menos sinais de conflito.
O que isso muda na prática?
As conclusões sugerem que políticas públicas devem olhar para além da fase inicial de contratação. É fundamental acompanhar e adaptar os contratos ao longo da execução, promovendo ajustes sustentáveis quando necessário. Além disso, o estudo também reforça a importância de critérios de julgamento que vão além do menor preço, priorizando propostas com maior valor social ou ambiental.
Apesar dos benefícios identificados, os autores alertam que práticas sustentáveis devem ser reais e monitoradas. Alegações falsas de sustentabilidade — o chamado greenwashing — ainda são um risco. Por isso, a transparência e a clareza dos objetivos sustentáveis nas renegociações são essenciais.
Por fim, a pesquisa amplia o entendimento sobre o papel da contratação pública na agenda sustentável. Mostra que renegociar contratos com esse foco pode, sim, trazer ganhos ambientais e econômicos, ao mesmo tempo que melhora a relação entre as partes envolvidas. Isso abre caminho para que políticas públicas usem a execução contratual como uma ferramenta estratégica de impacto positivo.
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