Vivemos um momento em que crianças chegam à escola dominando celulares, tablets e navegando com fluidez no universo digital. Ao mesmo tempo, o mercado de trabalho que as espera é completamente diferente daquele enfrentado por seus pais – e até mesmo por seus professores. O mundo mudou. E a escola?
Infelizmente, muitas instituições ainda insistem em um modelo pedagógico desatualizado, com foco em conteúdo, repetição e padrões. Enquanto isso, o século XXI exige muito mais: pensamento crítico, colaboração, habilidades socioemocionais, domínio das tecnologias. A pergunta inevitável é: quem vai liderar essa transformação?
O desafio é grande e a responsabilidade recai sobre os ombros dos líderes educacionais. Eles não podem mais se contentar em apenas “gerir” escolas. Precisam liderar com propósito, visão de futuro e coragem para romper com o tradicionalismo que não é suficiente para preparar nossos estudantes de hoje para o que vem por aí.
Organizações internacionais como o Banco Mundial e a OCDE vêm apontando há anos a necessidade de um novo paradigma educacional, baseado em múltiplas competências e não apenas no cognitivo. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) já apresenta esse caminho no Brasil, propondo dez competências que devem nortear a formação dos alunos. Entre elas, estão a cultura digital, o pensamento crítico, a empatia e a responsabilidade cidadã — temas que vem sendo explorados recentemente, porém ainda de forma tímida nas discussões curriculares.
Mas, como todo processo de mudança, essa transformação encontra resistências. Muitos pais ainda avaliam as escolas com base em critérios ultrapassados. Outros sentem-se inseguros diante de propostas pedagógicas inovadoras, por não encontrarem nelas os mesmos marcos de sua própria formação escolar. Há um descompasso entre o que a escola precisa oferecer e o que as famílias esperam — e cabe à liderança educacional fazer essa ponte.
O futuro da educação não se resume a salas com lousas digitais ou plataformas interativas. A verdadeira inovação está na forma como ensinamos, no protagonismo dado aos alunos, na capacidade da escola de ser flexível e de se adaptar às necessidades de cada estudante. Tecnologias como realidade virtual, inteligência artificial e aprendizagem adaptativa são ferramentas poderosas, mas de nada servirão se usadas para repetir modelos antigos com cara de novo.
A pandemia escancarou esse dilema. Em poucos dias, escolas do mundo todo migraram para o digital, expondo desigualdades e fragilidades do sistema educacional. Mas também revelou o potencial transformador da tecnologia e, principalmente, a importância de líderes preparados para agir diante do inesperado. Mais do que nunca, ficou claro que a liderança educacional é estratégica — e não operacional.
É preciso deixar claro: inovar em educação não significa apenas adotar novas ferramentas, mas repensar o próprio papel da escola. Instituições educacionais devem ser centros dinâmicos, capazes de organizar e dar sentido à vida em sociedade. A escola é um espaço que estrutura comportamentos, linguagens e valores — e isso exige um projeto pedagógico coerente com a realidade atual.
O caminho é desafiador, mas possível. Já existem escolas que estão liderando esse movimento, adotando metodologias ativas, promovendo o protagonismo estudantil e desenvolvendo projetos pedagógicos conectados com o mundo real. No entanto, elas ainda são minoria.
A missão do líder educacional, portanto, vai além da gestão de orçamento ou da contratação de professores. Ele deve ser o principal agente de mudança, capaz de engajar sua equipe, dialogar com as famílias e inspirar uma nova cultura organizacional. Como nos lembra a OCDE, liderar é exercer agência — é ser capaz de influenciar positivamente o mundo ao seu redor.
Se queremos uma educação verdadeiramente transformadora, precisamos de líderes que assumam essa responsabilidade com ousadia e sensibilidade. Líderes que compreendam as mudanças globais, mas que saibam traduzir essas tendências para o contexto local. Líderes que vejam seus alunos como cidadãos do mundo e não apenas como números em rankings educacionais.
A escola do futuro começa com a liderança do presente. E ela precisa, urgentemente, abandonar o papel de gestora da rotina para assumir o protagonismo na construção de uma nova educação — mais humana, mais conectada e, sobretudo, mais significativa.
Alessandra Chemello, COO do Bernoulli Educação e Doutoranda em Administração de Empresas FGV EAESP
Texto originalmente publicado no blog Gestão e Negócios do Estadão, uma parceria entre a FGV EAESP e o Estadão, reproduzido na íntegra com autorização.
Os artigos publicados na coluna Blog Gestão e Negócios refletem exclusivamente a opinião de seus autores, não representando, necessariamente, a visão da Fundação Getulio Vargas ou do jornal Estadão