Filipe Fortunato é Aluno do Doutorado em Administração de Empresas e Mestre em Gestão pela FGV EAESP. Professor de Educação Executiva e consultor de empresas, possui mais de 30 anos de experiência como empresário e executivo C-Level nos setores de Viagens, Turismo e Educação Internacional
Vivemos a era da interrupção. Em reuniões corporativas, em conversas de corredor e até em interações virtuais, é cada vez mais raro encontrar alguém que nos escute de fato. No lugar da escuta ativa, proliferam interrupções e respostas apressadas. Essa deterioração da capacidade de escutar parece não ser apenas um efeito colateral da correria do dia a dia, mas também um reflexo da ansiedade gerada pelo imediatismo das redes sociais e pelas respostas, cada vez mais rápidas, das ferramentas de inteligência artificial generativa.
A transformação digital, impulsionada pelas redes sociais, alterou profundamente a maneira como processamos informações e interagimos, tornando a comunicação mais veloz, porém menos reflexiva. Impactados por feeds que nos bombardeiam com atualizações constantes e notificações que exigem resposta imediata, nossos cérebros estão sendo condicionados a consumir conteúdo de forma rápida e fragmentada. Esse comportamento se transfere para as relações interpessoais no trabalho, onde a urgência de responder supera a necessidade de compreender. O resultado? Colaboradores impacientes, líderes que não captam conteúdo relevante e tomam decisões baseadas em interpretações superficiais, em vez de informações completas e fundamentadas em evidências.
A tecnologia nos coloca diante de um paradoxo: à medida que nos tornamos mais conectados ao mundo digital, nos distanciamos das interações pessoais. Quanto mais absorvemos conteúdos online, menos exercitamos a capacidade de escutar nossos interlocutores. Os prejuízos dessa mudança comportamental são evidentes. A falta de escuta gera mal-entendidos, intensifica tensões interpessoais, reduz a eficácia das reuniões e enfraquece o engajamento entre colaboradores. Estudos apontam que a comunicação deficiente é uma das principais causas de baixa produtividade e desmotivação nas empresas. Quando um colaborador sente que não é ouvido, seu senso de pertencimento e sua proatividade diminuem, criando um ciclo vicioso de desalinhamento e ineficiência.
É preciso resgatar a escuta ativa como uma competência essencial para líderes e equipes. Considerada um soft skill fundamental, a escuta ativa não é apenas escutar, mas criar um espaço de atenção plena e de acolhimento, onde o interlocutor se sente compreendido e encorajado a aprofundar sua própria reflexão. No ambiente corporativo, essa habilidade se traduz na capacidade de estar presente no diálogo, demonstrando interesse genuíno e garantindo um espaço de fala sem interrupções, essencial para fortalecer relações e aprimorar a comunicação.
A transformação digital aumentou e acelerou, de forma inevitável, o fluxo de informações. No entanto, é possível reequilibrar a forma como lidamos com esse volume crescente de estímulos. Escutar com atenção não é apenas um ato de respeito e boa educação, mas uma conduta organizacional essencial para empresas e executivos que buscam alinhamento, inovação e produtividade. No final do dia, aqueles que dominam a escuta ativa tomam decisões mais assertivas e lideram com maior eficácia e legitimidade.
Texto originalmente publicado no blog Gestão e Negócios do Estadão, uma parceria entre a FGV EAESP e o Estadão, reproduzido na íntegra com autorização.
Os artigos publicados na coluna Blog Gestão e Negócios refletem exclusivamente a opinião de seus autores, não representando, necessariamente, a visão da Fundação Getulio Vargas ou do jornal Estadão