No mercado corporativo, é comum que empresas que estejam enfrentando grandes dificuldades financeiras entrem com pedidos de falência. Nesses casos, elas podem continuar operando e traçando um plano de reorganização econômica ao mesmo tempo em que ficam protegidas pela lei contra possíveis ações judiciais. No entanto, essas companhias podem agir de forma estratégica para se beneficiarem do sistema judicial, aumentando seus níveis de alavancagem – ou seja, a utilização de recursos de terceiros na companhia – nos anos que antecedem o pedido de falência. Com isso, os prejuízos são transferidos aos investidores. Os empresários, por sua vez, enfrentam uma dívida reduzida, abusando estrategicamente do sistema judiciário.
É o que mostra artigo publicado pelo pesquisador da FGV EAESP André Aroldo Freitas de Moura, em colaboração com Jairaj Gupta e Mariachiara Barzotto, na revista “Abacus”. Para investigar os fatores que afetam a reestruturação de empresas após pedidos de falência, os autores analisaram 574 pedidos de falência e 398 resoluções bem-sucedidas nos Estados Unidos, entre 1994 e 2019, a partir de um banco de dados sobre casos de falência no ramo corporativo. Um resultado positivo é considerado quando a empresa passa por reorganização econômica, é adquirida ou fundida.
Alavancagem pode ajudar as empresas a saírem da falência, mas empresários podem manipular o sistema em busca de benefícios financeiros
De acordo com a pesquisa, um aumento na utilização de capital externo nos anos anteriores ao pedido de falência aumenta a probabilidade das companhias se restabelecerem. No entanto, muitas organizações praticam a alavancagem de forma estratégica, buscando financiamentos e empréstimos de credores quando percebem a falência como um resultado inevitável. Assim, no caso de um resultado judicial favorável à empresa, os danos econômicos são assumidos pelos investidores e o empresário tem uma dívida reduzida, obtendo benefícios financeiros com o processo. Ainda de acordo com o estudo, as companhias podem começar a manipular o sistema até quatro anos antes de declararem falência.
A pesquisa também aponta outros fatores que contribuem para que companhias tenham maior chance de continuar suas operações após passarem por processos de falência. A troca do diretor executivo (CEO), por exemplo, aponta uma mudança estratégica de gestão que impacta positivamente o desempenho das companhias nesses processos. Por outro lado, manter CEOs altamente qualificados com conhecimentos específicos da empresa também pode beneficiar a empresa. A experiência do juiz responsável pelo processo e uma pré-negociação da falência também trazem resultados favoráveis.
Para evitar práticas exploratórias e desencorajar comportamentos abusivos, os pesquisadores sugerem às autoridades alterar as políticas de falências existentes. As recomendações incluem restringir o acesso aos tribunais de falências, reduzir isenções e elaborar planos de pagamento de dívidas mais longos. Outra sugestão é exigir que as empresas apresentem políticas e programas de gestão de dívidas no planejamento organizacional das empresas, fora do contexto de falência.