Quanto maior a força organizacional dos partidos políticos, traduzida em termos de recursos financeiros e abrangência territorial, maior a unidade e disciplina dos deputados federais nas votações na Câmara dos Deputados. Por outro lado, maior democracia interna em partidos acaba gerando bancadas menos coesas e disciplinadas. As constatações são de estudo de coautoria do doutorando da FGV EAESP Luís Locatelli com pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos publicado na revista “Dados” nesta segunda (16).
A análise considera os 17 maiores partidos na Câmara dos Deputados na legislatura 2011-2014, que abrangem cerca de 95% dos parlamentares à época. Os pesquisadores calcularam as variáveis força organizacional e democracia interna dos partidos com base em dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e dos estatutos e resoluções das legendas. A força organizacional das legendas é determinada por índice que considera proporcionalmente a filiação total do partido, o número de diretórios municipais e as receitas totais do diretório nacional. Já a democracia interna é mensurada por elementos como inclusão e participação dos filiados nas instâncias decisórias. As taxas de unidade e disciplina foram variáveis também consideradas no cálculo.
Os autores identificaram três grupos de partidos de acordo com a sua complexidade institucional e participação das instâncias locais e regionais no poder: partidos pequenos e médios, frágeis e pouco democráticos, com concentração de poderes e recursos nos órgãos nacionais e pouco poder decisório nas bases; partidos médios e grandes, com relativa democracia interna (DEM, PSB, PSDB, PP, PDT, PV e PMDB), em que há maior nível de inclusão dos interesses regionais e locais; e o PT, que é o partido mais forte entre as 17 legendas analisadas e apresenta nível de inclusividade superior aos demais nos processos decisórios.
Os dados sugerem que os partidos com maior democracia interna têm bancadas menos coesas e disciplinadas. Por outro lado, a concentração de poder na cúpula impõe punições aos parlamentares, o que colabora para que reproduzam o posicionamento determinado pelo partido. A pesquisa destaca, ainda, um achado ideológico: quanto mais à direita o partido, menores suas taxas de unidade e disciplina. Já a esquerda apresenta dois casos desviantes. O PT tem, ao mesmo tempo, a estrutura decisória mais inclusiva e altas taxas de unidade e disciplina. O PCdoB, embora tenha a menor força organizacional dos 17 partidos analisados, tem a bancada com mais altas taxas de unidade e disciplina no período.
Segundo Pedro Floriano Ribeiro, um dos autores do estudo, o objetivo da pesquisa é entender como se organizam os partidos políticos brasileiros a partir de uma perspectiva comparada, pela qual é possível confrontar os dados nacionais com as tendências de outros países. “O nível de força do partido, medido principalmente em termos de dinheiro, impacta no comportamento parlamentar. Partidos fortes produzem comportamentos mais coesos e mais disciplinados em Brasília porque o parlamentar precisa do partido para sua tentativa de reeleição ou de se eleger para outro cargo. Isso passou a ser mais importante nesses últimos anos, quando a campanha passou a ser financiada pelo fundo partidário ou fundo eleitoral”, ressalta o pesquisador.
Outra conclusão importante do trabalho, conforme Ribeiro, é que o nível de democracia interna dos partidos brasileiros é muito baixo, com desempenho ruim em diversidade de gênero, diversidade de minorias nas elites dirigentes e participação da base de filiados. Apesar da imagem desgastada que têm diante da opinião pública, não há democracia sem partidos políticos, explica o autor. “Entendemos que a recuperação da democracia brasileira passa inevitavelmente pela recuperação dos partidos no sentido de incentivar arranjos institucionais internos mais democráticos que deem mais espaço para as minorias, para os jovens, e que levem a decisões internas mais transparentes e legítimas, complementa.