Quando falamos em adaptação de expatriados, muitas vezes pensamos que falar a mesma língua ou compartilhar traços culturais facilita o processo. No entanto, uma pesquisa publicada na Journal of International Business Studies mostra que essa visão simplifica demais a questão. O estudo de Roberta Aguzzoli, Martyna Śliwa, Jorge Lengler, Chris Brewster e Denise Quatrin (FGV EAESP), revela que a história colonial entre Brasil e Portugal pesa fortemente na experiência de adaptação de brasileiros que trabalham em terras portuguesas.
A pesquisa teve abordagem qualitativa e interpretativista. Dessa forma, foram realizadas 42 entrevistas com brasileiros que atuaram ou atuam em Portugal em diferentes setores e níveis hierárquicos. As entrevistas revelaram como os participantes narram e interpretam suas vivências. Além disso, a análise utilizou livros de história brasileiros e portugueses para comparar como cada país ensina sua versão do passado colonial.
Resultados: adaptação parcial e narrativas históricas
Os relatos mostram que, apesar da proximidade cultural, a adaptação dos brasileiros em Portugal é parcial. Ou seja, muitos aprendem a se virar no dia a dia (adaptação cognitiva) e até ajustam alguns comportamentos (adaptação comportamental). Mas, no campo emocional (adaptação afetiva), persistem sentimentos de desconforto, frustração e até ressentimento.
Sendo assim, dois tipos de narrativas se destacaram:
- A narrativa da “Brasilidade”, ligada ao orgulho nacional e ao direito de estar em Portugal, reforçada pela memória da resistência ao período colonial.
- A narrativa do “brasileiro marginalizado”, baseada na percepção de que portugueses veem brasileiros como inferiores, o que dificulta a construção de relações positivas.
Essas narrativas, enraizadas no passado colonial, influenciam como os expatriados interpretam situações de trabalho e como respondem a elas. Embora o idioma seja o mesmo, o sotaque brasileiro frequentemente desperta estereótipos negativos. Muitos entrevistados relataram que a língua, em vez de aproximar, serviu como barreira. Portanto, isso limitou a criação de redes locais de apoio e dificultou o sentimento de pertencimento.
O que isso significa para empresas e gestores
O estudo desafia a ideia de que a adaptação melhora naturalmente com o tempo. No caso de contextos marcados por histórias coloniais, a adaptação plena pode nunca acontecer. Para empresas internacionais, essa é uma lição importante: não basta considerar fatores culturais e institucionais, é preciso também reconhecer o peso da história.
A recomendação dos autores é que organizações capacitem seus funcionários a compreender diferentes narrativas históricas e a refletirem sobre preconceitos implícitos. Isso pode reduzir tensões, melhorar o ambiente de trabalho e favorecer a inclusão de expatriados.
Por fim, entender a expatriação exige olhar não apenas para cultura e língua, mas também para os legados históricos que moldam relações entre países. Para brasileiros em Portugal, a história colonial segue sendo um fator determinante em sua adaptação profissional e pessoal.
Leia o artigo na integra.
Nota: alguns artigos podem apresentar restrições de acesso.