A tradicional visão weberiana do papel dos burocratas no sistema político, onde atuam meramente como executores das políticas formuladas por políticos eleitos, tem sido desafiada pela literatura em administração pública ao longo dos anos. Novas pesquisas indicam que burocratas podem agir como empreendedores políticos, desempenhando um papel ativo na formulação e implementação de políticas públicas.
As pesquisadoras Mariana Costa Silveira e Gabriela Lotta, da FGV EAESP, em conjunto com Nissim Cohen, investigaram essa dinâmica em um estudo publicado na “Policy Studies Journal”. Utilizando dados de uma pesquisa online realizada em 2017 pela Escola Nacional de Administração Pública (Enap), que envolveu 2 mil burocratas do governo federal brasileiro, o estudo examinou como as interações entre burocratas e políticos influenciam a autoeficácia dos burocratas no empreendedorismo político. A autoeficácia é definida como a percepção do burocrata sobre sua capacidade de atuar como empreendedor político e obter bons resultados.
A pesquisa contou com um questionário de 110 perguntas, cobrindo perfis e percepções de trabalho dos burocratas. Através de análises estatísticas, os pesquisadores avaliaram a relação entre as interações político-burocrata e a autoeficácia dos burocratas. A influência de interações com colegas e atores não-governamentais também foi avaliada.
Assim, o estudo revelou uma relação positiva entre as interações com políticos e o senso de autoeficácia dos burocratas para se engajar no empreendedorismo político.
Portanto, burocratas com maior acesso a informações e oportunidades através de contatos com representantes eleitos conseguem influenciar políticos e suas redes de apoio, promovendo assim suas ideias políticas.
Além disso, as interações com colegas dentro da mesma organização mostraram-se cruciais para a autoeficácia dos burocratas. Porém, em contraste, conexões com burocratas de outras organizações tiveram um impacto menor. Os resultados também apontam que interações com a imprensa e sindicatos geram um maior senso de autoeficácia. Essas conexões fornecem suporte e visibilidade, incentivando os burocratas a se envolverem em atividades de empreendedorismo político.
Adicionalmente, a percepção dos burocratas sobre a reputação de sua organização na sociedade é outro fator significativo. Organizações bem vistas por sua expertise técnica e capacidade de resolver problemas proporcionam um ambiente propício para que os burocratas defendam novas soluções políticas.
Por fim, os resultados indicam que tanto preocupações sociais quanto objetivos individuais motivam os burocratas com alto senso de empreendedorismo político. Eles buscam causar um impacto positivo na sociedade, ao mesmo tempo em que almejam crescimento e reconhecimento profissional. Além disso, valorizam a discricionariedade, autonomia e a tomada de decisões baseadas nas necessidades dos cidadãos e em evidências.
O estudo evidencia a importância das redes e da reputação organizacional no desenvolvimento do empreendedorismo político entre burocratas. Ao fortalecer as interações político-burocrata e criar ambientes organizacionais colaborativos, é possível promover a autoeficácia.
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