Em conjunto com técnicas tradicionais, metodologias baseadas em inteligência artificial (IA) podem complementar a análise de dados qualitativos. A chamada mineração de textos – ou text mining – baseia-se na aprendizagem de máquina para extrair informações de materiais textuais. Num cenário de reutilização de dados gerados por outras pesquisas e sob moderação humana, a técnica tem o potencial de apoiar e aprofundar resultados previamente encontrados, revelar novas evidências e reduzir vieses humanos. Um novo modelo metodológico combinando meios tradicionais de pesquisa e big data é proposto como estratégia para enriquecer tais análises.
É o que mostra estudo publicado pelos pesquisadores da FGV EAESP Eduardo Henrique Diniz, João Luiz Becker e Henrique Pontes Gonçalves de Oliveira, em colaboração com Carla Bonato Marcolin, da Universidade Federal de Uberlândia, na revista “Qualitative Research in Organizations and Management”. Para comparar a análise de textos feita por seres humanos e máquinas, os pesquisadores aplicaram técnicas automatizadas de análise de dados em 25 entrevistas previamente analisadas por métodos tradicionais, buscando evidenciar as semelhanças e diferenças de cada tratamento.
O estudo original de onde foram coletados os dados tinha como objetivo entender a internacionalização da pesquisa de pós-graduação do Brasil. As 25 entrevistas realizadas para atingir o objetivo foram analisadas com métodos tradicionais da pesquisa qualitativa e resultaram na elaboração de um modelo de categorias contendo as principais perspectivas e estratégias para a inserção internacional da pesquisa brasileira. Com a análise baseada em IA, feita posteriormente, um novo modelo foi gerado e comparado com os resultados do método tradicional.
Inteligência artificial inspira novo modelo de pesquisa para complementar a análise qualitativa tradicional
Os autores apontam que a nova análise foi capaz de definir os mesmos tópicos revelados pela análise tradicional. Desta forma, confirmou duas das quatro categorias identificadas previamente como relevantes para o tema da internacionalização da pesquisa e distribuindo as demais em novos conjuntos equivalentes a um ou mais tópicos originais. O modelo da IA também revelou uma nova categoria considerada relevante que não havia sido adequadamente contemplada pelos pesquisadores na análise inicial – a importância do idioma inglês – mas não detectou um dos tópicos originais – a evolução do tema ao longo do tempo e suas perspectivas futuras.
A partir da comparação entre os dois modelos, os pesquisadores desenvolveram um novo modelo com contribuições de ambas as análises. O modelo final manteve as categorias iniciais, mas com um aprofundamento no conjunto de palavras associado a cada uma, a adição de uma nova categoria e uma organização hierárquica diferente, considerando as mudanças destacadas pela IA. Nesse cenário, a análise baseada em IA destacou-se como uma ferramenta complementar para a pesquisa qualitativa. Em pesquisas futuras, os autores sugerem testar a nova metodologia em diferentes conjuntos de entrevistas e aprimorar a tecnologia de forma a reduzir possíveis erros.