A pandemia de COVID-19 se tornou um dos maiores desafios globais de saúde do século, destacando a escassez e distribuição desigual de respiradores mecânicos, essenciais para o tratamento de casos graves. Assim, estima-se que cada respirador possa salvar entre 15 e 20 vidas. No Brasil, a incapacidade de fabricar rapidamente ventiladores suficientes evidenciou a existência de cerca de quatro mil aparelhos inoperantes em hospitais públicos e privados.
Diante dessa realidade, o pesquisador da FGV EAESP, Luis Vasconcellos, junto com outros pesquisadores, publicou um artigo na REGE Revista de Gestão. O estudo investigou a formação de uma rede de colaboração interorganizacional para consertar respiradores defeituosos. Assim, mais de cem atores se mobilizaram, gerando resultados notáveis e salvando milhares de vidas em 2020. Os pesquisadores realizaram um estudo de caso com 8 entrevistas, analisando a criação de um arranjo de empresas com um propósito comum e humanitário. As entrevistas foram interpretadas em três classes analíticas: potenciais agentes da rede, formação da rede interorganizacional e resultados efetivos alcançados.
Essas redes são arranjos multiorganizacionais que abordam problemas complexos reunindo recursos variados de cada participante.
Elas envolvem reciprocidade, interação, negociação e possuem elementos relacionais, estruturais e cognitivos. A pesquisa revelou que a qualidade dos relacionamentos, incluindo confiança e reputação, foi crucial para o rápido crescimento da rede. Os agentes já tinham um histórico de colaboração, facilitando a conexão entre eles. Além disso, a transferência de conhecimento e a disponibilização da infraestrutura necessária também foram características importantes. Com ajustes e aplicação de tecnologia, a rede conseguiu dobrar a capacidade de produção de respiradores das fábricas brasileiras.
No apoio institucional e logístico, os Ministérios envolvidos emprestaram legitimidade institucional à rede e removeram obstáculos legais e burocráticos. O SENAI capacitou a indústria automobilística, que forneceu infraestrutura e equipe para reparar os respiradores e organizou o esforço logístico nacional. Após 115 semanas, a rede conseguiu consertar mais de 60% dos respiradores recebidos, sem custo para o sistema de assistência hospitalar.
Por fim, os resultados sugerem que a sociedade, por meio de diferentes grupos sociais com seus papeis distintos, pode se auto-organizar rapidamente através da formação de redes colaborativas. Portanto, essa configuração organizacional pode ser uma alternativa para enfrentar crises onde ações isoladas seriam insuficientes ou lentas para lidar com urgência em situações complexas. A dinâmica de valores alinhados e estratégia de ação conjunta, juntamente com uma abordagem pragmática para o gerenciamento da crise, resultaram em uma contribuição histórica e inovadora para o país.
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