A ciência brasileira tem potencial para ampliar estudos sobre resiliência dos sistemas de saúde em colaboração com iniciativas internacionais, especialmente junto a países que também apresentam contexto de desigualdade socioeconômica e fragmentação do financiamento e da prestação de serviços. É o que aponta artigo dos pesquisadores da FGV EAESP Marco Antonio Catussi Paschoalotto, Eduardo Alves Lazzari, Rudi Rocha e Adriano Massuda com a pesquisadora da Universidade de Harvard Marcia Castro publicado na revista “Saúde Debate”.
Os autores realizaram coleta de dados em artigos científicos disponíveis em bases de dados SciELO, Web of Science, Scopus e PubMed e em relatórios técnico-científicos de instituições nacionais e internacionais, como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). A busca considerou os termos “sistema de saúde” e “resiliência”, e os pesquisadores identificaram a aplicação desse conceito em duas perspectivas distintas – anterior e posterior à pandemia de Covid-19.
Os primeiros resultados internacionais datam do período entre 2012 e 2014, discutindo perspectivas das políticas de saúde após a crise econômica global. O aumento de publicações sobre resiliência ocorreu a partir de 2015, relacionado à alta demanda dos sistemas de saúde em países de baixa renda no contexto da epidemia do vírus Ebola na África Ocidental. A abordagem foi aprimorada durante a pandemia de Covid-19, que evidenciou a importância da preparação aos alertas de saúde, do gerenciamento e do aprendizado a partir do choque.
Já no Brasil, os estudos de resiliência do Sistema Único de Saúde (SUS) pré-pandemia analisam principalmente programas e políticas de saúde mental e saúde dos trabalhadores, alinhados com a implementação de iniciativas como a Estratégia Saúde da Família (ESF) e com a discussão sobre impactos de medidas de austeridade fiscal no SUS. Durante a pandemia, os estudos abordaram os impactos das desigualdades na resposta à emergência de saúde e o desafio em manter a funcionalidade do sistema.
Resiliência do SUS: estudos podem detalhar desafios de financiamento e capacidade de resposta à crise
O artigo identificou quatro dimensões principais a serem aprofundadas em pesquisas sobre o SUS: governança e liderança, considerando a articulação entre governos federal, estadual e municipal nas respostas ao choque; financiamento, discutindo a destinação e gestão de recursos públicos e privados; recursos, incorporando discussões sobre força de trabalho, infraestrutura, medicamentos e tecnologias; e prestação de serviços, investigando a operação dos serviços de resposta à crise e a manutenção de outros serviços de saúde essenciais.
Entre os desafios para a agenda de pesquisa sobre a resiliência do SUS, estão a falta de estudos internacionais sobre a resiliência dos sistemas de saúde de países como Turquia, México e África do Sul, com contexto socioeconômico similar ao brasileiro. “No caso brasileiro, essa realidade é ainda impulsionada pela grande complexidade da conformação do seu sistema de saúde, que, apesar de ter a universalidade e a integralidade como princípios do SUS, convive com baixo financiamento crônico, frágil organização regional e presença de forte subsistema privado que compete com o sistema público”, aponta o estudo.